sexta-feira, novembro 10, 2006

Um Artista Popular...

Caros, como há muito tempo eu não tenho dado um sinal de vida claro aqui no blog, resolvi, ao invés de esperar uma inquietação que me motivasse de fato a escrever, tomar outro rumo “editorial”. A intenção, muito mais do que comentar ou criticar algo, é fazer uma reflexão. É um exemplo que dou, e não sei se vocês concordam, de que um outro homem é possível.

Essa entrevista pode ser lida na íntegra em
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1240476-EI6596,00.html Copiei as perguntas e as respostas como estão nesse endereço.


Há alguns anos eu era editor na Carta Capital, pautei e saiu aquela foto de vocês dois na última página. Leitores, mesmo alguns colegas, estranharam: "Mas como, Zezé de Camargo e Luciano em Retratos Capitais?" e eu respondia "o país inteiro gosta, qual é o problema?" De lá pra cá, aconteceu alguma coisa no Brasil, e o que aconteceu com vocês tem a ver também com filme. Vocês romperam uma bolha que tinha aí?
Eu sempre me considerei um vanguardista, vamos dizer assim, dentro da música sertaneja, porque sempre caminhei no sentido contrário ao óbvio, sempre gostei dessa coisa meio atrevida de brigar com os conceitos. Quando você briga com conceitos você acaba confrontando com o pré-conceito. Quando você encara eles, as pessoas que acham que você está fora do "conceito" certo e é aí que eles demonstram o preconceito deles. Acho que foi saudável isso para nós. Essa história do filme, de lidar com esse pessoal.

(aqui Zezé fala sobre a campanha pró-Lula que fez em 2002)

Já votou em um, já votou em outro, é isso que você quer dizer?

Isso. Tenho amigos de vários partidos. Eu voto nas pessoas, na plataforma de cada um. Sou um cara suprapartidário, mesmo porque partido aqui não tem ideologia nenhuma, nós temos um emaranhado de partidos, mais de trinta partidos no Brasil, você não sabe quem é quem. O cara fala no primeiro turno, xinga o outro de bandido, de ladrão, depois tá lá apoiando, você não pode entrar muito nessa conversa. Eu voto nas pessoas, mas sou amigo de vários outros políticos e outros partidos que fazem oposição a Lula. Tenho amigos dentro do PSDB também.

(aqui ele fala sobre o que acreditava no início da carreira, em que ele dizia que, por exemplo, gravar com Chico Buarque era besteira como uma defesa, pois achava que não iria acontecer)

É aquela história da raposa e das uvas verdes......
É, talvez fosse isso também. Tem uma frase que eu carrego comigo, eu digo que 'o ser humano tem a obrigação de enriquecer'. Se não conseguir enriquecer materialmente, pelo menos como ser humano, espiritualmente. Isso é primordial para o ser humano. Eu já cruzei com tantas pessoas lá do interior que nunca puseram uma botina no pé, e que são tão ricas espiritualmente. Um exemplo, o meu avô, o pai do meu pai, era um velhinho riquíssimo ao ponto que viu minha vó morta assim, todo mundo chorando, e ele ficou olhando pra ela... Ele era analfabeto de pai e mãe - meu pai já é humilde e ele é dez vezes mais humilde que meu pai - e ele não chorava.

E aí?
Aí eu falei assim: "Vô, o senhor não está chorando, o senhor não vai ficar com saudade da vó?". Ele falou: "Não meu filho, sabe por que eu não estou chorando por ela? Eu nunca xinguei, eu nunca briguei com ela, eu nunca ofendi, eu nunca fiz um mal pra ela. Então, eu sei que ela tá indo embora e eu fiz tudo o que eu podia fazer de bem pra ela em vida, então não estou em dívida com ela. Ela está indo porque tem que ir mesmo, e eu também vou um dia. A gente só chora a morte de alguém porque você sabe que você ficou em falha com aquela pessoa, você podia ter feito algo mais e não fez. Eu não fiquei devendo nada pra ela, ela está indo porque eu sei que ela tem que ir, daqui a um tempo eu vou também. Eu não tenho dívida com ela, nem ela comigo, então, nós estamos indo juntos, ou não, separados, mas a alma está junto". Isso que eu aprendi com meu velho, com meu avô, com meu pai, são coisas que a gente tem que carregar com a gente.

6 Comments:

At sábado, novembro 11, 2006, Blogger Rafael said...

Confesso que pra mim é, no mínimo, surpreendente. Sempre achei que o Zezé tinha consciência mas alguns Gugus, Faustões, Hebes, aquele abandono das roupas e cabelos das antigas e outras coisas mais, me deixavam um pouco cabrero. Se eu tiver oportunidade de entrevistá-lo um dia farei perguntas referentes a isso, olhando para as respostas que ele deu nesta entrevista creio que as minhas dúvidas devem ser esclarecidas com explicações cabíveis e conscientes.

Aliás, a história do vô do cara é de arrepiar... definição perfeita de valores, sensacional!

 
At sábado, novembro 11, 2006, Blogger Gustavo said...

E não sei como tem gente que faz vista grossa a pessoas como o Mirsomar. O que me assusta é que os ícones hoje são os Chorões da vida, que obviamente só fizeram sucesso graças a ajudas externas e que, por óbvio, não contrariam nem um pouquinho o senso-comum.

Não sou fã de música sertaneja, mas sou fã do que é original, do que é competente, do que é autêntico, e assim é a capacidade do Zezé, inegável para qualquer um! Não importa se a música que ele faz não é erudita, importa que, através de sua competência, ele obteve sucesso em sua área. Um outro homem é possível, mesmo que com gel no cabelo e roupas moderninhas sendo entrevistado pela hebe.

 
At sábado, novembro 11, 2006, Blogger Gustavo said...

E não sei como tem gente que faz vista grossa a pessoas como o Mirsomar. O que me assusta é que os ícones hoje são os Chorões da vida, que obviamente só fizeram sucesso graças a ajudas externas e que, por óbvio, não contrariam nem um pouquinho o senso-comum.

Não sou fã de música sertaneja, mas sou fã do que é original, do que é competente, do que é autêntico, e assim é a capacidade do Zezé, inegável para qualquer um! Não importa se a música que ele faz não é erudita, importa que, através de sua competência, ele obteve sucesso em sua área. Um outro homem é possível, mesmo que com gel no cabelo e roupas moderninhas sendo entrevistado pela hebe.

 
At segunda-feira, novembro 13, 2006, Blogger Leonardo Croatan said...

"Skateboard, Maloqueiro, que as 'mina' pagam pau, eu sou de Santos, sou Charlie Brown"

Ouvi essa música (?) hoje de manhã, indo pra faculdade. E o Chorão é o ícone da revolução atual. A revolução que hoje se quer fazer é uma revoluação dos atos, e não das idéias. Atos que não têm idéias que os suportem não são dignos de reconhecimento. Infelizmente, esse vazio é o Mickey Mouse dos nossos tempos. As sociedades são iconólatras e prestam atenção ao que caras como o Chorão dizem, sem prestar atenção nos ideais que movem determinado ser em determinadas culturas (como na música sertaneja).

Confesso que nunca fiz Juízo sobre o Zezé di Camargo, e a única conclusão a que eu podia chegar, de acordo com o que eu conhecia adele, era a de que eu não gostava da música que ele fazia.

Agora, com essa manifestação interessante, acho que, mesmo falando com a Hebe ou com o Faustão, esse é um cara digno de ter atenção.

Agora eu me pergunto: essa entrevista foi pro Terra, que, mesmo com a evolução dos meios de informação da internet, não é algo que as pessoas tenham por costume analisaar (como a Hebe e o Gugu, por exemplo). Será que o cara puxa esse tipo de conversa no sofá da Hebe? Ou será que ele se restringe às futilidades que são temas desse tipo de programa?

Confesso que eu fico curioso com isso.

Aliás,

"primeiro, porque não fiz show de graça pro Lula, eu ganhei, trabalhei como profissional."

Excepcional essa frase.

 
At segunda-feira, novembro 13, 2006, Blogger Gustavo said...

Cara, eu acho que o mérito por ele ter falado isso e não as banalidades que ele fala no faustão ou na hebe é do jornalista que o entrevistou, que, por sinal, como ele informa, foi editor da revista carta capital. Até porque não haveria razão em falar com uma hebe sobre certos assuntos.

Mas eu fico totalmente perdido ao ver os ícones de hoje, primeiro que buscar alguém para seguir já estranho, e mais estranho ainda é quando esse alguém é imposto e todos aceitam sem questionar. Não se discute mais o por que que aquele personagem merece tua admiração, ou, pelo contrário, merece a admiração por motivos banais e irrelevantes, do tipo: bah, é show o CPM né? Aham...

Eu to pensando seriamente em virar pescador em alguma vila no ceará.

 
At segunda-feira, novembro 13, 2006, Blogger Leonardo Croatan said...

É bem isso: não há porque seguir alguém. O máximo que se pode fazer é acompanhar alguém cujas idéias correspondem às nossas e que não irá impor ou submeter suas vontades às nossas.

Esse é o grande problema dessas vidas que cultuam ícones. Buscam alguém par ser uma resposta irracional aos problemas. Cada ícone é, em sua própria forma, um dogma em que alguém acredita.

As "idéias" despertam do ícone, e não o ícone que desperta das idéias. Esse é o trunfo da irracionalidade. Também acho que o mérito é do cara que o entrevistou.

Mas porque o Zezé se submete à Hebe e aos demais? A resposta provavelmente é porque essa é a forma dele fazer o próprio marketing frente ao público.
O problema é que assim ele adota um público vazio como a Hebe. Frequentando esse tipo de programa, ele abdica dessas idéias que vimos na entrevista passa a dar aos "populares" a falta de valores pela qual eles anseiam.

Isso até que seria interessante em um ponto de vista mais seletivo, mas não é porque ajuda expandir um mundo contrário às idéias que a gente viu (e gostou de ver) nessa entrevista.

A entrevista é excepcional, mesmo, mas é lamentável ver um cara com essa consciência desperdiçado no vazio valoratício da sociedade.

 

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